sexta-feira, 15 de novembro de 2013

O Brasil devia ter saudades de seus aventureiros. São melhores que os acomodados - por Fernando Brito (Tijolaço)


Desde Delmiro Gouveia, que teimou até fazer uma usina hidrelétrica no Rio São Francisco, para fabricar linhas de costura, nos anos 1910, estes tipos tiveram o mesmo fim.

Como se sabe, Delmiro foi assassinado.

A inglesa Machine Cotton, fabricante das Linhas Correntes, que havia perdido para ele o monopólio do mercado brasileiro e latinoamericano em linhas de costura,comprou a Fábrica da Pedra, em Pernambuco.

Quebrou os prédios e atirou as máquinas nas corredeiras do rio.

Hoje, ler na Folha o pedido do presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Andrade, pedindo que o Brasil faça com os Estados Unidos um tratado à imagem e semelhança do NAFTA, com que os americanos anexaram economicamente seu ex-rebelde vizinho, o México, deu-me tristeza ver como a elite econômica do Brasil não consegue nos ver senão como um território econômico colonial.

O argumento é o de que o Brasil vende aos EUA uma proporção maior de manufaturados, enquanto a China nos importa basicamente commodities.

Isso seria ótimo, claro, se a perda de barreiras alfandegárias fosse apenas na porta de saída do Brasil e na entrada nos Estados Unidos.

O “probleminha” destes tratados é que há o “vice-versa”.

E o vice-versa, com o fim dos impostos de importação para produtos americanos – a grande maioria montados a partir de suas “plataformas”  no exterior, significa arrasar nosso mercado interno, sobretudo na indústria pesada.

Imaginem a alegria das empresas fornecedoras das petroleiras americanas se puderem, sem impostos de importação, todos os bilhões de dólares que a exploração do petróleo do pré-sal vai demandar?

Bye-bye, como diz o Paulo Henrique Amorim, conteúdo nacional. E com ele indústrias e empregos no Brasil.

Um querido ex-cunhado, que viveu no México, contou-me de sua impressão ao ver, numa manifestação popular, uma faixa onde se lia: “Más mercado para nuestras artesanías”. É isso mesmo: artesanato.

O Brasil não é um país protecionista. Qualquer empresa, de qualquer parte do mundo, que queira produzir aqui, não apenas pode como é paparicada com isenções e dilações de prazos fiscais.

Na China, uma grande empresa que queira se instalar por lá, é forçada a fazer sociedades locais e produzir de acordo com o que faz mais falta à economia do pais.

Pergunte, por exemplo, a Embraer se ela entra na China como se fosse a casa da sogra.

Mas os grandes empresários brasileiros estão longe de apostar na inovação, na criatividade, na educação e aperfeiçoamento de sua força de trabalho, na parceria com as universidade.

E se não fosse o “arcaico” estatismo, que mobiliza o BNDES para os que querem investir em infraestrutura e em conquista de mercados mundiais – o que, depreciativamente, a imprensa econômica chama de “os campões do Brasil” – estaríamos retrocedendo em alta velocidade.

Porque há um vício – crônico e confortável – de viver do chororô tributário, mesmo quando o governo faz desonerações como jamais aconteceram em nossa história. E a este governo não o apoiaram de forma consistente na batalha pela redução dos juros.

Quando, entre 2009 e 2011, período em que ganharam como nunca na explosão de crescimento no Brasil, usaram este caixa para melhorar suas estruturas e processos produtivos?
Ah, mas sofrem a concorrência dos importados…

E com acordo de livre trânsito de mercadorias com os EUA vão sofrer menos?

País nenhum, nenhum, no mundo se desenvolveu de fronteiras abertas – e qualquer um de nós pode ver como as nossas já o estão em grande parte.  Deveriam se mirar no esforço do país em abrir novos mercados, na Ásia e na África, e sair como caixeiros viajantes atrás de negócios vantajosos, o que não terão com os EUA.

Por aqui, “agregar valor”, porém, é algo que se diz dos “reis dos camarotes”, que vivem do esbanjamento.

Enquanto isso, os micro e pequenos dão nó em pingo d’água e cambalhotas diárias para ir em frente.

E conseguem.

Olhem aí no gráfico o número de pequenas empresas – e o projetado para os próximos anos – e de microempreendedores individuais. Eles já são 25% do PIB brasileiro, mais da metade do emprego e da massa de salários.

O número de empregos formais quase dobrou, apenas entre 2008 e 2011: saíram de 8,6 milhões para 15,6 milhões.

Hoje, 69% dos que se tornam empreendedores o fazem porque vêem nisso uma oportunidade, não por não contarem com outra saída. Exatamente o inverso de 2002, quando 56% iam fazer algo por conta própria por necessidade, porque não havia empregos e oportunidades de geração de renda.

Talvez daí nos venha uma geração de empresários que olhe para seu próprio povo como uma oportunidade de negócios, não como um desagradável problema.

Porque entre nossas elites nos falta  uma burguesia propriamente dita.

A que está aí vive mais no mundo das finanças do que no da produção.

Mais do que seus produtos, sonham é em vender o negócio. 

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