segunda-feira, 12 de julho de 2010

Sayad nega ingerência política na TV Cultura - por Sonia Racy, Jotabê Medeiros - O Estado de S.Paulo

O presidente da Fundação Padre Anchieta, João Sayad, negou ontem ter havido motivação política no afastamento de Gabriel Priolli da Diretoria de Jornalismo da TV Cultura. Ele alegou que Priolli não tinha o perfil adequado para o cargo na emissora, gerida pela fundação.

"Foi uma escolha equivocada", afirmou Sayad. Jornalista experiente, com passagem por alguns dos principais jornais e televisões do Brasil, Priolli trabalha para a TV Cultura há mais de uma década e permaneceu apenas uma semana no cargo.

Seu afastamento alimentou a suspeita de ingerência política na emissora pública ligada ao governo de São Paulo. Segundo versão amplificada pela internet, Priolli foi afastado do posto por orientar a produção de uma reportagem sobre as tarifas de pedágio nas estradas estaduais, tema abordado com insistência pela campanha do PT ao governo paulista.

O jornalista preferiu não se manifestar sobre o episódio: "Vou manter silêncio, pois ainda sou funcionário da TV Cultura". O destino de Priolli dentro da emissora deve ser definido hoje, em reunião com o vice-presidente da fundação, Ronaldo Bianchi. Tanto a nomeação quanto a destituição de Priolli foram comunicadas a ele pelo diretor de Conteúdo da TV Cultura, Fernando Vieira de Mello.

O seção paulista do PT anunciou que vai pedir ao Ministério Público Eleitoral que investigue o afastamento de Priolli. O candidato do partido ao governo de São Paulo, Aloizio Mercadante, foi entrevistado para a reportagem sobre pedágios, assim como o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin.


Comentário (Luis Nassif)

João Sayad pode ter inúmeros defeitos. Mas sempre foi suficientemente inteligente e bem humorado para não se expor ao ridículo. Desta vez, não escapou. Passa a integrar o longo elenco de seguidores do rei, que entregam a ele tudo, até a imagem pública. Aliás, é o primeiro graduado a entrar na lista.

Priolli é jornalista conhecido. Tem histórico, para ser analisado. De repente, entra a nova direção, coloca-o no cargo de diretor de jornalismo e descobre uma semana depois que não tem "perfil". E qual a matéria que determina essa brusca mudança de avaliação? A do pedágio, óbvio, a única que foi pessoalmente derrubada pelo vice-presidente de programação Fernando Vieira de Mello, no dia anterior ao da demissão de Priolli.


A alegação de Vieira de Mello - em entrevistas posteriores - foi a de que a matéria era falha por não ter ouvido todos os candidatos ao governo de Estado em período eleitoral. Só faltava, para cada tema estadual ouvir todos os candidatos. Não sairia uma matéria sequer sobre o assunto. Esse suposto cuidado eleitoral ocorre no momento em que seguidores do candidato a presidente Plínio de Arruda Sampaio montam campanha na Internet para solicitar que o Roda Viva - o principal programa da Cultura - dê ao candidato o mesmo espaço concedido a Serra, Dilma e Marina. Para o principal programa da emissora, não é necessário perseguir a isonomia. Para uma matéria de três minutos sobre pedágios, sim.

Outro ponto foi o afastamento de Heródoto Barbeiro. Com ou sem a pergunta sobre pedágio a Serra, Herótodo estava com os dias contados devido a idiossincrasias antigas do próprio Serra. Ele nunca escondeu seu desagrado com Heródoto, a quem taxava de "petista".


Quem acompanha os comentários de Heródoto sabe que está longe de ser considerado petista. Pouco importa se na soma final, Heródoto seja um crítico contumaz do governo. No reino de Serra não há espaço para contemporizações nem para sutilezas: ou apoio integral ou a fogueira. Qualquer implicância do chefe, qualquer sinal de desagrado é senha para degolas, para não se incorrer na sua ira. Daí essa truculência de demitir um diretor de jornalismo devido a uma única reportagem - sem a menor sensibilidade para prever a grita que se seguiria.


O primeiro ato da gestão dessa fortaleza chamada Paulo Markun foi afastar Heródoto do Jornal da Cultura. Houve enorme grita dos telespectadores. Heródoto acabou voltando dentro de um modelo de jornal - com duas apresentadoras - que matou completamente o espírito original do Jornal da Cultura. Mudança de perfil, inconsistência na grade, subordinação da pauta aos interesses do Palácio Bandeirantes transformaram o Jornal da Cultura em um programa irrelevante - ainda na gestão Markun.

Markun deu tudo o que Serra pediu. Tinha assegurada sua permanência no cargo porque Serra o apoiava. Dançou quando foi alvo de um elogio público de Geraldo Alckmin, dizendo que gostava muito dele. Foi o que bastou para perder o apoio de Serra, que é contrário a amores volúveis. Perdendo, dançou. O Palácio fez uma gambiarra, lançou o Secretário da Cultura João Sayad para presidente da Fundação Padre Anchieta e improvisou Andréa Matarazzo como interino até o final do mandato. E venceu as eleições para presidente da FPA. E ainda há quem discuta se há ingerência política ou não na ex-BBC brasileira.

Ocorre que TV é cast - apesar das TVs públicas ainda não terem descoberto o óbvio. E Heródoto é de longe o jornalista mais premiado e conhecido da TV Cultura. Aliás, ele não é apenas respeitado: é dos poucos jornalistas efetivamente amados por seu público. Se a decisão de trocar Heródoto do Roda Viva era anterior, qual a razão para, até agora, não ter sido definido seu novo papel na programação. Justo ele, o mais premiado jornalista da Cultura?


A informação passada de que a decisão de afastar Heródoto nada teve a ver com a pergunta sobre o pedágio esconde o essencial: quem pediu sua cabeça foi Serra, por idiossincrasias antigas. Mesmo sem o pedágio, teria dançado.


Aliás, a cada governo estadual que passa, mais admiração tenho pelo ex-governador Paulo Egydio Martins.

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