terça-feira, 16 de junho de 2009

Economistas não-neoliberais concluem: crise é estrutural - por PHA

A reportagem que se segue é uma colaboração deLeonardo Nunes para o Conversa Afiada:
A Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP) e a Sociedade Latino-Americana de Economia Política (SEPLA) organizaram, entre os dias 9 e 12 de junho, o XIV Encontro Nacional de Economia Política e o V Colóquio Internacional da SEPLA em São Paulo. Trata-se de um dos congressos acadêmicos mais importantes em teoria crítica. No centro do debate, como não poderia deixar de ser, a crise econômica mundial.
A mesa de abertura reuniu os professores Wilson Cano (Unicamp), Marcio Pochmann (Unicamp e IPEA) e Antônio Correa de Lacerda (PUC-SP). Apesar das inúmeras divergências, um consenso emergiu. A crise econômica, desencadeada pelo colapso do mercado imobiliário norte-americano, é estrutural e não conjuntural. Isto significa dizer que os fundamentos da crise foram gestados durante as últimas três décadas, sendo conseqüência do arranjo monetário baseado em regimes cambiais flexíveis e liberdade no movimento de capitais. Estes fatos, associados à estagnação dos salários reais, num contexto de aumento da produtividade e ampliação do consumo, sobretudo nos EUA, através do endividamento, resultou no colapso do sistema financeiro mundial, a partir do crash do mercado imobiliário norte-americano.
A importância dos déficits gêmeos como possíveis indicadores da crise também foi abordada no evento. Além disso, ressaltou-se que a falta de um arcabouço institucional capaz de regular o sistema monetário internacional, aliado a falta de instrumentos de controle de capitais, serviram como combustíveis para o caos econômico. Apesar das dificuldades em encontrar soluções definitivas, foi destacada a importância do estabelecimento de políticas anticíclicas coordenadas, tais como pacotes fiscais e diminuição das taxas de juros. Já o Brasil, segundo os debatedores, não sofrerá um forte impacto, apesar do seu elevado passivo externo líquido.
O presidente do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), por sua vez, centrou sua análise nos possíveis efeitos da crise no Brasil. Numa corajosa exposição, Pochmann criticou duramente a política monetária empreendida pelo Banco Central, sobretudo a lentidão da autoridade monetária para diminuir a taxa de juros desde o início da crise. Além disso, foi mencionado o fato de que o problema em questão não é conjuntural, mas estrutural do modo de produção capitalista. O Brasil, segundo o economista, deve aproveitar o contexto para promover uma refundação do Estado, de forma a adequá-lo às necessidades da população. Uma medida importante seria a adoção de uma reforma tributária que estabelecesse um sistema progressivo, que onere os mais abastados. Entretanto, Pochmann alertou para as dificuldades de tal projeto. Segundo ele, o mesmo só poderá ser levado a cabo a partir do enfraquecimento das bases políticas majoritárias, que poderá apenas ocorrer através do agravamento da crise.
O economista Costas Lapavitsas (SOAS/University of London) destacou a importância do endividamento individual nos EUA como componente singular da atual crise econômica. Já Win Dierckxsens lembrou a importância do impacto ambiental que tal modo de produção, sustentado pelo padrão de consumo norte-americano, pode produzir. Neste sentido, seria indispensável repensar as estruturas produtivas, bem como suas respectivas matrizes energéticas, e a estrutura de bens produzidos. Por fim, o presidente da SEP, Paulo Nakatani (UFES), mencionou o fato de que as crises são inerentes ao capitalismo, ou seja, estão na gênese do capital. Portanto, ela é o momento de exacerbação destas contradições, que se repõem de outras formas – normalmente mais agudas - depois de sua superação.
Divergências, debates e inúmeras dúvidas marcaram o congresso. Certeza, apenas uma. A crise é estrutural – e grave. O Brasil, por enquanto, reúne condições privilegiadas para enfrentá-la. Cabe ao governo ter coragem política para adotar as medidas necessárias, tais como política fiscal anticíclica, redução consistente da taxa de juros, reforma tributária, dentre outras, para que possamos superá-la sem grandes perturbações.

Leonardo Nunes é mestre em economia pela Unicamp e doutorando em economia pela Université Paris I Panthéon-Sorbonne.

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