terça-feira, 4 de março de 2008

Para o Jornal nacional, Venezuela e Equador "Ameaçam" Colômbia - por Maria Tereza

O assunto é muito grave e preocupante.

Houve uma inaceitável violação do princípio fundamental e internacionalmente aceito de inviolabilidade territorial. Violação por parte da Colômbia contra o Equador.

Como usual, as notícias serão totalmente manipuladas pela imprensa no Brasil, com flagrante defesa de interesses dos EUA. Seremos muito “trabalhados” pela mídia nos próximos dias. Se preparem, pois já começou. Por exemplo, o programa matinal da TV Globo “Bom Dia Brasil” de hoje, no espaço de Alexandre Garcia, em evidente manobra diversionária, despendeu 90% do tempo destinado à notícia do ataque colombiano no Equador para demonizar “o tenente-coronel Hugo Chavez” da Venezuela... Não ouvi do comentarista uma crítica sequer à invasão militar colombiana no Equador. Fora do foco completamente, pois o presidente colombiano Uribe é o culpado confesso da grave crise. Nada justifica aquela violação territorial, mesmo ele sendo estreito aliado dos EUA e tendo recebido ou não ajuda ou o prévio respaldo daquela grande potência.

Dissertarei a seguir sobre os fatos e suas entrelinhas, utilizando informações hoje colhidas no “blog do Azenha”, no jornal “Folha de São Paulo”, em notícias de hoje na TV e em artigos deste “democracia & política” que têm interface com o problema, aqui publicados desde janeiro último.

O ATAQUE DA COLÔMBIA NO EQUADOR

De acordo com o presidente do Equador, Rafael Correa, ele foi informado do ataque pelo presidente Álvaro Uribe, da Colômbia. Descreveu Rafael Correa:

"Ele me chamou hoje de manhã (ontem) para me informar que, em um encontro armado entre o exército colombiano e as FARC, uma coluna das FARC entrou em território equatoriano continuando a disparar. As forças armadas colombianas tiveram que se defender".

Continua o presidente equatoriano: "Com surpresa, descobrimos, após, que se tratava de um acampamento temporário da guerrilha colombiana a dois quilômetros da fronteira com a Colômbia, dentro de nosso território. Forças militares colombianas aerotransportadas invadiram o espaço aéreo e terrestre equatoriano. Os alvos já haviam sido previamente localizados e bombardeados à noite por aviões colombianos com a ajuda de tecnologia de ponta de potências estrangeiras extra-regionais. Não somente isso, as tropas colombianas entraram e levaram o cadáver de Raúl Reyes, deixando 15 cadáveres na região, assim como duas guerrilheiras feridas. Os guerrilheiros foram massacrados enquanto dormiam. Estavam de pijama."

"Tudo demonstra que o Ministério da Defesa, a chancelaria e o presidente Uribe estão mentindo ao Equador", disse o presidente do Equador.

O corpo de Raúl Reyes, foi levado para a Colômbia - assim como computadores e documentos da guerrilha. O material apreendido foi examinado por peritos de agências de segurança dos Estados Unidos, conforme o próprio governo colombiano admitiu em nota oficial. De posse do material, o governo americano poderá divulgá-lo seletivamente, com base na verdade ou não, de acordo com seus objetivos políticos. Certamente, incriminarão com grande destaque na mídia, gravemente, a Venezuela e o Equador por apoios às FARC.

O governo da França lamentou a morte de Raúl Reyes, informando que ele era o contato por ele usado para tentar a libertação da senadora colombiana Ingrid Bettancourt, que tem cidadania francesa e é refém das FARC.

Hugo Chávez, durante o programa dominical “Alô Cidadão”, pediu ao ministro da Defesa que deslocasse dez batalhões para a fronteira com a Colômbia, sem, contudo, ato similar de invasão do território colombiano. Segundo a BBC, a mobilização deve envolver tanques e milhares de tropas.

"O governo da Colômbia se converteu no Israel da América Latina”, disse Chávez.O governo equatoriano convocou a Comunidade Andina de Nações, o Mercosul e a Organização dos Estados Americanos (OEA), para evitar que o conflito causado pela Colômbia seja internacionalizado.

Amanhã (3ª), haverá na sede da OEA, em Washington, uma reunião especial de embaixadores dos países membros, para tratar da crise.

Agora à noite, foi anunciado que o Equador suspendeu as relações diplomáticas com a Colômbia, o que é um agravamento da crise.

O ENVOLVIMENTO DOS EUA

Há muitas considerações políticas e estratégicas a fazer. Cito algumas.

A Colômbia se consolida como o braço militar dos Estados Unidos na América do Sul. Segundo a revista “Times” desta semana, os EUA já investiram no “Plano Colômbia” mais de US$ 5 bilhões, sob a desculpa de combate ao narcotráfico. Lá estão sediados efetivos militares norte-americanos e muitos armamentos e aeronaves fornecidas ou operadas pelos EUA. A citada revista ontem publicou que o cultivo de coca, todavia, voltou a crescer na Colômbia.

Rafael Correa passou a ser considerado uma ameaça aos interesses estratégicos dos Estados Unidos na região, já que não pretende renovar em 2009 o tratado que permite a Washington manter uma base militar em Manta, no Equador - a partir da qual, dizem os americanos, são feitos vôos para monitorar o narcotráfico.

Representantes militares dos EUA já justificaram a intervenção militar americana na Amazônia colombiana e equatoriana como a única solução que sobrou. Chegaram a utilizar armas químicas e biológicas para devastar as plantações de coca na Amazônia.

Disseram que assim têm que agir na América Latina porque fracassaram na repressão interna, nos EUA, à importação, ao comércio e ao uso de drogas. Segundo eles, aquelas ações repressoras dentro dos EUA violaram muito a lei, a liberdade e o direito do cidadão norte-americano de comprar drogas ou drogar-se. Por isso, tinham que empreender aqueles combates fora do território dos Estados Unidos...

O PAPEL QUE CABE AO BRASIL

Ao Brasil interessa circunscrever com sua ação diplomática o triste episódio somente aos dois países, Colômbia e Equador, e contribuir para que as relações se normalizem o mais rapidamente possível entre eles. Seria muito prejudicial a todos os países da região o agravamento da crise.

O RISCO DE “PRE-EMPTIVE WAR”

É fácil imaginar que há terceiras grandes potências extra-regionais que poderiam tirar proveito de eventual ampliação do conflito na América do Sul. Estão em jogo outros interesses estratégicos e geopolíticos muito maiores. Petróleo, Amazônia, matérias-primas...

Segundo o jornalista Luiz Carlos Azenha, “o que a Colômbia fez foi aplicar, na América do Sul, a "doutrina do ataque preventivo" do governo Bush. Isso abre as portas para que a Argentina faça o mesmo no Uruguai, o Brasil faça o mesmo no Paraguai e a Bolívia faça o mesmo no Chile”.

Esse direito citado por Azenha foi instituído pelos EUA há alguns anos, exclusivamente para eles.

Já comentamos esse conceito norte-americano em outro artigo neste blog. É o “direito estadunidense de atacar sem avisar, em qualquer país, sempre que lhes seja conveniente ou suspeitem de ameaças aos seus interesses de qualquer natureza”. É a “Pre-emptive War”.

Esse “direito” foi estabelecido “democraticamente” pelo Congresso norte-americano, em lei. Portanto, consideram legal... Abrange matar sem julgamento. Já citei em outro artigo que um ex-chefe do FBI no Brasil externou que o presidente Bush autorizou ao FBI e CIA os assassinatos (tratados por eles, eufemisticamente, como “sancionar” alguém) (Revelação dele à “Carta Capital” no 283, 24/03/2004, pág. 51).

Na matéria postada em 7 de janeiro último sob o título “Novo Iraque?”, a primeira e inaugural deste blog, externei o temor de que os EUA e a Inglaterra preparam, para médio prazo, talvez menos de 10 anos, uma ocupação militar da Venezuela para garantir o suprimento de petróleo necessário à continuação e à melhoria da qualidade das economias daquelas potências. Minha motivação de escrever surgiu porque o Jornal do Brasil daquele dia publicara que o Suriname pretende ceder aos Estados Unidos uma grande área para instalação de uma base militar americana. A Guiana, vizinha da Venezuela, está negociando com o Reino Unido a concessão de 25 mil hectares para o mesmo fim.

É o prenúncio de uma nova Guerra do Iraque na nossa fronteira, o que certamente prejudicará gravemente a soberania brasileira sobre o próprio território e causará no Brasil gigantescos impactos negativos, políticos, econômicos, sociais e militares.

Vários outros indícios dessa preparação estão presentes intensamente na nossa grande mídia e nos partidos mais de direita que têm sido historicamente instrumentos dos grandes interesses norte-americanos.

Por exemplo, já é um sucesso a campanha de demonização do Presidente Chavez. Ela já conquistou grande parte dos corações e mentes brasileiros, especialmente dos jornalistas. Predispõe a nossa aceitação e a atitude colaborativa para a futura invasão norte-americana e inglesa. A muito repetida história de a Venezuela estar se armando desmedidamente em relação aos demais países da América Latina não resiste a uma análise técnica comparativa. Essa informação tem fins capciosos. Mesmo considerando que suas novas aquisições de armas já tenham sido recebidas (não é o fato) e que os venezuelanos já estejam em condições de operá-los, mesmo assim o Chile, o Peru, a Argentina (nessa ordem) têm poder militar maior do que o da Venezuela. O Brasil, infelizmente, tem somente um grande efetivo, na maior parte composto de recrutas temporários, mas tem reduzida capacidade militar moderna, menor que a dos citados países (sugiro a leitura de “Forças Armadas para quê?”, postada em 17 fev neste blog).

Voltando ao que dissemos sobre a manipulação pela mídia, no início deste artigo, vi há pouco o repórter William Bonner abrir o “Jornal Nacional” com a manchete: “Venezuela e Equador ameaçam usar a força militar contra a Colômbia”. Inverteu toda a história...

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